Clássicos do Cinema Nacional - 1962
"O Pagador de Promessas" é, em essência, mas não só, o retrato do choque entre a devoção simples e até mesmo algo simplória do povo comum e o enrijecimento burocrático da religião organizada, neste caso, o Catolicismo. O herói quer simplesmente pagar uma promessa feita, já que julga que foi atendido em suas súplicas. E, para isso, moverá Céus e Terra, impulsionado pelo justo desígnio que o anima, o qual, nos moldes de sua fé autêntica, está salvaguardado como direito e dever sancionados pelo próprio Criador. Neste caso, a temática tem certo parentesco com a oposição entre o Direito Natural e o Direito dos Homens, na Antígona de Sófocles, protótipo da Ética, de Hegel. Antígona se baseia no direito de origem divina que têm os homens de enterrar condignamente seus mortos ao insistir nos funerais de Polinices, seu irmão, morto na luta contra seu outro irmão, Etéocles, pelo trono de Tebas, cujo enterro e manifestações de luto haviam sido proibidos num édito de Creonte, o novo rei. O direito de Antígona, sacramentado na tradição religiosa, seria, segundo o seu ponto de vista, transcendente ao poder efêmero de um rei. Ou seja, em ambos os casos, seja na peça de Sófocles, seja na de Dias Gomes, a justiça desse acordo firmado com um poder celeste não pode ser contestada por um poder temporal. Por isso, Zé do Burro insiste corajosamente na sua promessa, opondo-se ao poder ocasional, efêmero, que o Padre exerce sobre o mero espaço físico da Igreja, pois o seu direito transcende a "posse" - entre parêntesis, pois ninguém deve possuir o que é de Deus e para o povo - do Padre Olavo. A peça de Dias Gomes e, consequentemente, o filme dirigido por Anselmo Duarte, desvelam vários aspectos sócio-econômicos e culturais do Brasil. A obtusidade de um clérigo que se mostra insensível ao nível de apreensão da realidade de uma pessoa simples, do campo. A incapacidade do Estado - no caso, a Polícia - em lidar com questões multiculturais, transformando o que é diferença cultural em caso de policia. A enorme distância entre o Brasil urbano e o Brasil rural: os citadinos - Padre, Monsenhor, Policial, Jornalista - se mostram incapazes de sequer intuir a forma de pensar de Zé do Burro, seus limites, seu condicionamento de homem do interior, sua forma antiintelectual de apreender o real, ao passo que o "pagador de promessas" em momento algum consegue compreender por que padre, polícia, etc, se opõem ao seu singelo ato de honrar um ato de devoção tão óbvio, tão cristão... Um filme inesquecível, imperdível e que deve, obrigatoriamente, fazer parte da coleção de qualquer cinéfilo que se preze. Ganhador da Palma de Ouro, em Cannes(1962); Prêmio "Golden Gate", como Melhor Filme e Melhor Trilha Sonora no Festival Internacional de Cinema de São Francisco;(1962) sendo, ainda, indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro (1963).
AVI"O Pagador de Promessas" é, em essência, mas não só, o retrato do choque entre a devoção simples e até mesmo algo simplória do povo comum e o enrijecimento burocrático da religião organizada, neste caso, o Catolicismo. O herói quer simplesmente pagar uma promessa feita, já que julga que foi atendido em suas súplicas. E, para isso, moverá Céus e Terra, impulsionado pelo justo desígnio que o anima, o qual, nos moldes de sua fé autêntica, está salvaguardado como direito e dever sancionados pelo próprio Criador. Neste caso, a temática tem certo parentesco com a oposição entre o Direito Natural e o Direito dos Homens, na Antígona de Sófocles, protótipo da Ética, de Hegel. Antígona se baseia no direito de origem divina que têm os homens de enterrar condignamente seus mortos ao insistir nos funerais de Polinices, seu irmão, morto na luta contra seu outro irmão, Etéocles, pelo trono de Tebas, cujo enterro e manifestações de luto haviam sido proibidos num édito de Creonte, o novo rei. O direito de Antígona, sacramentado na tradição religiosa, seria, segundo o seu ponto de vista, transcendente ao poder efêmero de um rei. Ou seja, em ambos os casos, seja na peça de Sófocles, seja na de Dias Gomes, a justiça desse acordo firmado com um poder celeste não pode ser contestada por um poder temporal. Por isso, Zé do Burro insiste corajosamente na sua promessa, opondo-se ao poder ocasional, efêmero, que o Padre exerce sobre o mero espaço físico da Igreja, pois o seu direito transcende a "posse" - entre parêntesis, pois ninguém deve possuir o que é de Deus e para o povo - do Padre Olavo. A peça de Dias Gomes e, consequentemente, o filme dirigido por Anselmo Duarte, desvelam vários aspectos sócio-econômicos e culturais do Brasil. A obtusidade de um clérigo que se mostra insensível ao nível de apreensão da realidade de uma pessoa simples, do campo. A incapacidade do Estado - no caso, a Polícia - em lidar com questões multiculturais, transformando o que é diferença cultural em caso de policia. A enorme distância entre o Brasil urbano e o Brasil rural: os citadinos - Padre, Monsenhor, Policial, Jornalista - se mostram incapazes de sequer intuir a forma de pensar de Zé do Burro, seus limites, seu condicionamento de homem do interior, sua forma antiintelectual de apreender o real, ao passo que o "pagador de promessas" em momento algum consegue compreender por que padre, polícia, etc, se opõem ao seu singelo ato de honrar um ato de devoção tão óbvio, tão cristão... Um filme inesquecível, imperdível e que deve, obrigatoriamente, fazer parte da coleção de qualquer cinéfilo que se preze. Ganhador da Palma de Ouro, em Cannes(1962); Prêmio "Golden Gate", como Melhor Filme e Melhor Trilha Sonora no Festival Internacional de Cinema de São Francisco;(1962) sendo, ainda, indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro (1963).
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5 comentários:
O "X" da questão em relação à resistência de Padre Olavo ao ato de fé de Zé do Burro, não é o pagamento da promessa em si. O problema maior, que o clérigo invoca para impedir a manifestação da entrega da cruz em frente ao altar da igreja, é o fato de Zé ter tido a visão/inspiração da promessa dentro de um terreiro de Candomblé (ou Umbanda, não lembro mais). Este era o cerne da questão. Naquele tempo, mais ainda do que hoje, a Igreja Católica via com maus olhos e muita preocupação a prática do sincretismo, isto é, da mistura dos símbolos religiosos de uma igreja institucionalizada, como a Católica, com as práticas supersticiosas de uma religião animista e fetichista, como o Candomblé e/ou a Umbanda. A "identificação" entre São Jorge e Ogun (acho), entre Nossa Senhora e Iemanjá, etc., desde longo tempo incomodavam/incomodam os teólogos católicos. Que dizer de um padreco ignorante do interior do Brasil? Este padre, por certo, desconhecia que a própria Igreja Cristã, tão logo tornou-se institucionalizada, na forma da Igreja Católica, usou do sincretismo para, por exemplo, transformar a festa pagã de louvor ao deus Mitra na data de nascimento de Jesus Cristo (25 de dezembro) e tornar tal festividade mais "atrativa" aos olhos dos pagãos recém convertidos. O mesmo pode ser dito em relação a Maria, que foi alçada da mera condição de mãe de Jesus à de mãe de Deus, como forma de rivalizar com os difundidíssimos cultos à Grande Mãe e Ísis, deusas pagãs de grande apelo popular. Os exemplos são muitos. Mas, como se sabe, a História é contada pelos vencedores...
good points and the details are more specific than elsewhere, thanks.
- Norman
Gente, esse filme eh inspirado no livro do Dias Gomes?
abraço
Sim Juliana. Origina-se da peça de teatro de Dias Gomes, publicada em 1959.
Olá, gostei muito do blog e também dos comentários muito bem elaborados sobre os filmes. Quero avisar que infelizmente os links para estas quatro postagens de clássicos nacionais estão invalidados pelo megaupload.
Obrigado
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